E tome-se de confessionário:
Amanheci, tenho amanhecido, de vazios.
Ouvi, para esquecer nunca mais,
Somos, na verdade, mais feitos de vazios a cheios,
Eletrosferas que abrigam enormes vãos e milimétricos núcleos.
Tenho amanhecido de vazios
Vazios corrosivos de arde-peito
Batida de carro, batida de coração
Paixão.
Não corrosão-possessão, não.
Arrebatamento, repetição do lugar comum das palavras, mas,
sim, cegueira, êxtase, explosão.
Falta-me ao colchão algo (calor de pele, calor de tis) que
justifique tuas imensas ausências,
Óh, tus, que jamais me fostes meus.
Insone, rodeando lobo a cama em todos os ângulos, em todas
as partes,
Peixe perdido no reflexo do vidro do aquário, buscando o
quê?
Fechar os vazios das bolhas expiradas,
Tarefa inconsequente, injustificada, inobjetiva.
Meu lugar nenhum de eu mesmo, é lá que agora quero chegar.
Meu lugar da paixão calada, latente, latejada, câncer
corrosivo há tanto guardado, Lutando para ser expelido, eliminado, transformado
em algo, outro algo que um dia se chame de outra coisa, que comumente se chama
de a coisa, a tal amor.
Amor no meu verbo, no meu ato, no meu mundo é como mar para
outros mundos, é feminino.
Amar hoje é meu lado feminino, bambo, torto, frágil,
intenso, forte, não hesitante e tão hesitante, certeiro, objetivo, descarado,
sem- vergonha. Tudo o que um dia o meu amor masculino prendeu em lamento, em
covardia, em insucesso, em falta de coragem, em preso de garganta, em pigarro,
em refluxo, em parado, em silêncio, em calado de calo ardido na corda vocal
bamba que volta e que volta e que volta.
Tenho amanhecido de cheios vazios que me estouram os pulmões e laceram as costelas. Lutando por
um pouco de tardia coragem, ou cara-de-pau.
Tenho pensado com a cabeça, a cabeça do pau, estou a cara do
pau. Sou pau que mete na cabeça uma ideia, a ideia de gozo, que gozo. Me gozo,
que bobo, com essa história toda de amanhecer vazios.
Paixão, não me perca por aí.
Eu tô é aqui, lado a lado, do lado de ti.
05.04.13
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